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Grounded Theory: o passo a passo para construir teoria a partir dos dados

Você já deve ter sentido isso: começa uma pesquisa sem saber exatamente quais perguntas fazer. A bibliografia é escassa, as teorias existentes não dão conta e, no fundo, você sabe que precisa deixar o campo falar. É exatamente para esses momentos que a Grounded Theory foi criada.


A Grounded Theory é uma forma de pensar pesquisa qualitativa: cíclica, comparativa e profundamente ancorada na experiência real dos participantes.


Neste guia, eu vou te mostrar passo a passo como aplicar a Grounded Theory de forma prática, sem perder a sofisticação que ela exige.


1. Comece com perguntas abertas, não com hipóteses

A Grounded Theory parte de questões amplas. Não é o momento de “testar” algo pronto, mas de explorar. Exemplo:

  • “Como trabalhadores remotos criam limites entre trabalho e vida pessoal?”

  • “Quais processos ajudam enfermeiros a manter a resiliência em contextos de crise?”

Essas perguntas guiam sua primeira coleta, mas vão mudar conforme você avança.


2. Colete e analise ao mesmo tempo

Ao contrário dos métodos tradicionais, aqui coleta e análise caminham juntas.Você não espera terminar todas as entrevistas para começar a codificar. Faz algumas, analisa, identifica padrões iniciais e volta ao campo com perguntas mais refinadas.

Essa alternância é o que dá vida à teoria.


3. Use o método da comparação constante

O constant comparison é a espinha dorsal da Grounded Theory. A cada novo dado, pergunte:

  • Isso confirma o que já encontrei?

  • Isso contradiz e me obriga a repensar?

  • Isso expande o que eu sabia, trazendo uma nuance nova?

Esse exercício transforma observações dispersas em categorias robustas.


4. Ajuste a amostra com base no que encontrar

Chama-se amostragem teórica: as próximas entrevistas são definidas pelo que os dados anteriores indicaram que falta. Talvez, depois de ouvir trabalhadores solteiros, você perceba que precisa incluir pais e mães no estudo. Ou que, além de funcionários, precisa falar com gestores. Cada nova coleta serve para preencher lacunas na construção da teoria.


5. Avance pelas etapas de codificação

A codificação é gradual e reflexiva:

  • Aberta: você identifica códigos diretamente a partir dos dados, sem forçar categorias prévias.

  • Axial: conecta códigos entre si, buscando relações e agrupamentos.

  • Seletiva: integra as categorias em torno de um conceito central que explica o fenômeno.


6. Continue até atingir saturação teórica

Você chega à saturação quando novos dados não trazem informações relevantes ou alterações significativas às categorias existentes. É o ponto em que a teoria se mantém estável mesmo diante de novos casos.


7. Construa a teoria

O resultado final não é só uma lista de temas, mas uma explicação integrada de como o processo acontece, sustentada pelas categorias que emergiram do ciclo coleta-análise-comparação.


Quando a Grounded Theory não se aplica

Ela não é o método ideal quando:


  • Você já parte de um referencial teórico consolidado que orienta toda a coleta.

  • A base de dados é fixa e não há possibilidade de coleta iterativa.

  • O objetivo é apenas descrever padrões, sem construir uma teoria explicativa.

  • Você trabalha com análises quantitativas ou altamente estruturadas, onde não há espaço para que a coleta seja guiada pelas descobertas do próprio campo.


Nesses casos, métodos como análise temática indutiva ou análise de conteúdo podem ser mais adequados.


Por que a Grounded Theory é tão poderosa?

Porque ela não descreve apenas o que existe, mas explica como e por que um fenômeno acontece. Ela nasce do campo, cresce com o campo e, quando amadurece, devolve ao campo uma teoria que realmente faz sentido para quem vive aquele contexto.

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